OBSERVATÓRIO
ASTRONÔMICO KAPPA CRUCIS
Uma história que precisa
ser contada
Idealizado e construído em Belo Horizonte, MG, no final da década de 50 pelo
astrônomo amador Dr. Ernesto Reisenhoffer, falecido em 1978. Engenheiro mecânico
da Companhia Belgo-Mineira, descendente de americanos, possuía virtudes raras,
como simplicidade e idealismo aliados a uma enorme competência. Morávamos próximos,
no mesmo bairro Floresta, em Belo Horizonte e tínhamos o mesmo gosto pela astronomia.
Casado com Dª Estelita, não tiveram filhos. Dr. Ernesto construiu o observatório
nos fundos de sua casa, trabalhando praticamente sozinho à noite, nas férias
e nos fins de semana, fazendo arcos de madeira e revestindo tudo com chapas
de ferro galvanizado. Gastou uns dois anos, com a pesada cúpula de 3 metros
de diâmetro girando suavemente acionada por um motor elétrico.
Abria o observatório a todas as pessoas
interessadas e apesar de ser como eu membro do Centro de Estudos Astronômicos
de Minas Gerais (CEAMIG), não tinha tempo para freqüentar as reuniões que fazíamos
e assim os sócios iam até ele com freqüência conversar sobre astronomia. E foram
nestes encontros no Kappa Crucis que os astrônomos amadores de Belo Horizonte
retomaram o projeto de construção de um grande observatório astronômico em Minas
Gerais, movimento iniciado 5 anos antes (1954) ao encaminharem um pedido neste
sentido ao então governador de Minas Gerais Juscelino Kubitschek. Somente em
1972 este objetivo foi alcançado com a criação do Observatório Astronômico da
Serra da Piedade, vinculado a UFMG.
O primeiro telescópio do Kappa Crucis
foi um refrator com 150 mm de abertura e 2250 mm de distância focal (f/d=15,
foto). A montagem em equatorial tinha o mecanismo do movimento horário acionado
por uma mola de aço em espiral, não sei se de relógio, filmadora ou toca-discos.
Funcionava espetacularmente bem, mas a cada 20 ou 30 minutos a mola acabava,
tendo ele que "dar corda" novamente para o telescópio seguir acompanhando
a rotação terrestre. Posteriormente, substituiu este mecanismo por um motor
elétrico. Em 1971 cedeu este telescópio para seu amigo Nelson Travnik, que o
instalou no Observatório Flammarion em Matias Barbosa, MG, extinto. Construiu
um outro em seguida, um refletor newtoniano com 200 mm de abertura e 2400 mm
de distância focal (f/d=12), aonde combinou uma montagem alto-azimutal com equatorial
(fotos). Poucos anos depois, alegando que aquele céu magnífico que Belo Horizonte
tinha não existia mais, estragado pela iluminação pública com lâmpadas de vapor
mercúrio, resolveu desativar o observatório. Mais uma vez, vende o telescópio
para Nelson Travnik e me presenteou com a cúpula e a torre. Desmonta-lo foi
uma tarefa difícil, tendo eu o levado para minha casa, aonde permaneceu desmontado.
Dr. Ernesto construiu outros telescópios,
tendo eu a oportunidade de aprender bastante com ele, engenheiro mecânico muito
habilidoso que era. Durante muitos anos o observatório recebeu, alem dos amadores,
pessoas de expressão entre eles, em Março de 1964, o Dr. Jean Rösch, diretor
do Observatório de Pic du Midi, na França. Ele aquí esteve a convite do Dr.
Henrique Wykrota, fundador do CEAMIG e na época o seu Presidente, para auxiliar
na escolha de sítio do observatório que acabou sendo instalado na Serra da Piedade.
Em 1978, aproveitei, como professor da
UFMG que era, para levar o CEAMIG, do qual também era seu Presidente, para o
Museu de História Natural e Jardim Botânico da UFMG. Alí, eu havia feito o projeto
do Parque Astronômico junto com os irmãos Afonso e Teodorico Gonçalvez, na época
membros ativos do CEAMIG. Para lá levei o observatório mas o Museu jamais permitiu
que ele fosse montado. Permanecendo no tempo, ele se estragou bastante nos anos
que lá ficou. Apesar de grande esforço, não conseguimos implementar o projeto
do Parque Astronômico e o CEAMIG se viu obrigado a sair do Museu. Levei, então
o observatório novamente para minha casa aonde, já muito danificado e desmontado
no tempo, se estragou de vez, não valendo mais a pena recupera-lo. Com relação
ao Dr. Ernesto, em 1978 Dª Estelita, sua esposa, veio a falecer depois de uma
queda e ele, mergulhado em profunda depressão, falece pouco tempo depois. Os
astrônomos profissionais brasileiros, reunidos então em um congresso da Sociedade
Astronômica Brasileira (SAB), fazem um minuto de silencio em homenagem a este
astrônomo amador que tanto trabalhou para a astronomia de Minas e do Brasil.
Aonde estão os dois telescópios do
Observatório Kappa Crucis: Em 1974, Nelson Travnik cedeu o refrator 150/2250
mm para o Observatório Astronômico Antares, Universidade Estadual de Feira de
Santana, Bahia, aonde se encontra operacional até hoje. O refletor newtoniano
que Travnik também comprou, foi por ele vendido para a cidade de Cachoeira,
também na Bahia, do qual não temos notícias.
Ao Dr. Ernesto Reisenhoffer, jóia rara como o Kappa Crucis que tanto admirava no Cruzeiro do Sul, a minha homenagem.
Bernardo Riedel.
Notícias do Kappa Cricis Ano de 2003.
Fotos do Observatório Kappa
Crucis.
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